Notificação
Notificações do denunciado - greve
Protocolo nº 27.273/2015. Comissão de Ética. Relator: Dr. Marcelo de Oliveira Fausto Figueiredo Santos. 163ª Reunião Ordinária da Comissão de Ética Pública, realizada no dia 23 de novembro de 2015.
Consulta sobre notificações do denunciado. O Relator apresentou voto respondendo a consulta nos seguintes termos: “Inicialmente observo que é direito de qualquer servidor (processado em qualquer instância, inclusive ética), de fazer-se presente em todos os atos do processo, ou por intermédio de advogado ou procurador. O artigo 156 da Lei 8.112/90 assegura: ‘(..) ao servidor, o direito de acompanhar o processo pessoalmente ou por intermédio de procurador, arrolar e reinquirir testemunhas, produzir provas e contraprovas e formular quesitos, quando se tratar de prova pericial’. Ocorre que tal direito é facultativo, podendo, o servidor fazer-se presente pelo advogado que constituiu, ou ver-se assistir (se for o caso) por defensor dativo, não só quando revel, mas também por imperativa determinação constitucional, que assegura em geral o direito à ampla defesa com todos os recursos a ela inerentes, além do contraditório (artigo 5º, inciso LV, da CF). A licença para tratamento de saúde está prevista na Lei 8.112/90, em seu artigo 202 e seguintes. ‘Art. 202. Será concedida ao servidor licença para tratamento de saúde, a pedido ou de ofício, com base em perícia médica, sem prejuízo da remuneração a que fizer jus. Art. 203. Para licença até 30(trinta) dias, a inspeção será feita por médico do setor de assistência do órgão de pessoal e, se por prazo superior, por junta médica oficial. § 1º Sempre que necessário, a inspeção médica será realizada na residência do servidor ou no estabelecimento hospitalar onde se encontrar internado. § 4º O servidor que durante o mesmo exercício atingir o limite de trinta dias de licença para tratamento de saúde, consecutivos ou não, para a concessão de nova licença, independentemente do prazo de sua duração, será submetido a inspeção por junta médica oficial’. A licença, segundo o magistério de Marçal Justen Filho é ‘a suspensão temporária do exercício das atribuições do servidor público estatutário, em situação de interesse alheio à Administração Pública, mas tutelado pelo direito. (...) É possível classificar as licenças em dois grandes grupos. Há aquelas que servem de instrumento à promoção de atividades de previdência social, e há as que assim não se configuram’. (Curso de Direito Administrativo, 8ª Edição, Ed. Fórum, Belo Horizonte, 2012, página 911 e seguintes). Em geral, o prazo máximo de duração de uma licença, é de vinte e quatro meses. Quando o servidor encontra-se licenciado para tratamento de saúde pelo período normal de até 30 dias, cremos que deve-se aguardar seu retorno para intimá-lo do processo ético. Supõe-se que, neste período, ordinariamente, resolva seu problema emergencial de saúde. A matéria, de fato não é tão simples. Isso porque, não há, regramento específico e abrangente sobre o tema. O que logrei localizar, (mediante a indicação do ilustre Conselheiro Marcelo Allencar de Araújo), orientação da C.G.U alusiva ao tema. De fato, lá encontramos (site oficial) a seguinte pergunta com a resposta: ‘Como proceder a notificação no caso de licença médica do servidor acusado? Quando o servidor estiver em licença médica e se recusa a receber notificação para figurar como acusado, deve a comissão provocar a junta médica oficial a se manifestar se a doença incapacita o acompanhamento do processo. Se a junta médica atestar que não incapacita, a comissão pode tentar notificá-lo, agindo da mesma forma do servidor encontrado e que se recusa a assinar a notificação’. Consultando a jurisprudência do E. Supremo Tribunal Federal, constato, igualmente, a citação da mesma orientação da C.G.U. em seus julgados. É o caso v.g. do MS 31812- DF, Relator Ministro Luiz Fux julgado em 29/04/2015. Verifico também que, não raro alguns servidores utilizam da licença médica como um subterfúgio para não receber intimações ou notificações. Existem casos relatados na jurisprudência dos tribunais exatamente nesse sentido. Há passagens de votos e decisões onde é possível ler: ‘referido servidor em gozo de licença médica, foram feitas diversas tentativas de notificá-la, inclusive com a disponibilidade de médico para que fosse atestada sua capacidade de dar ciência do recebimento, sem, porém, lograr sucesso. Tal notificação, finalmente ocorreu, por hora certa’. (MS 25.722, DF, Rel. Ayres Britto, julgado em 19/12/2005). (negritei). Por outro lado, é preciso observar que o fato do servidor estar em gozo de licença médica não impede a aplicação de penalidades. Nesse sentido, inter-plures, confira-se: (STJ AgRg no RMS 13855-MG, Relatora Min. Alderita Ramos de Oliveira, em 21/02/2013), desde que, obviamente, acrescento, seja-lhe garantida a ampla defesa e o contraditório, garantias constitucionais. Entendo que garantida o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório, a licença não pode ser um impeditivo ou um obstáculo ao regular processamento e apuração de eventuais infrações éticas. O servidor licenciado não está imune ao regime jurídico público e funcional a que está submetido. Por fim recordo posição da jurisprudência com a qual compartilho no seguinte sentido: ‘Conclui-se que a impetrante não exerceu o direito posto à sua disposição porque não quis, ainda que o exercício do direito de defesa não é um dever da parte, mas um ônus, sendo certo que a omissão da impetrante em constituir defensor e praticar os demais atos voluntários inerentes à sua defesa não implicam na nulidade do feito’. O caso vem assim ementado: ‘Mandado de Segurança. Administrativo. Servidor Público. Instauração de Processo Administrativo Disciplinar. Servidor Acusado sob Licença Médica. Nulidade. Inocorrência. (..) O fato da impetrante encontrar-se em licença para tratamento de saúde, quando da instauração do processo administrativo disciplinar, por si só, não enseja a nulidade, por ofensa ao princípio do contraditório e da ampla defesa". Ordem denegada’. (MS 8.102- DF- (2001/0194209-0, Relator Min. Hamilton Carvalhido - Terceira Seção, STJ unânime, DJ 24/02/2003). Finalmente a consulta pergunta sobre o andamento do processo ético durante a greve. Devo observar que o direito de greve constitui, por sua própria natureza, uma exceção dentro do funcionalismo público, e isso porque, para os serviços públicos, administrativos ou não, incide o princípio da continuidade. Desse modo, esse direito não poderá ter a mesma amplitude do idêntico direito outorgado aos empregados da iniciativa privada. Deveras , o STF inicialmente havia decidido sobre o tema que ‘aos servidores civis só se revelará possível o direito de greve depois da edição da lei complementar reclamada pela Carta Política’ (MI número 20, Pleno, Relator Min. Celso de Mello). Posteriormente, a despeito de lei sobre o tema, determinou a aplicação aos servidores públicos da disciplina da Lei 7.783/89, que regula o direito de greve dos empregados em geral na hipótese dos denominados ‘serviços essenciais’. Seja como for, em greve ou não, quando o servidor pratica um ilícito administrativo ou ético, a ele é atribuída a responsabilidade administrativa. O ilícito pode verificar-se por conduta comissiva ou omissiva e os fatos que o configuram são os previstos na legislação estatutária. Sobre o tema, já inclusive manifestei-me em artigo doutrinário: ‘Não há dúvida de que o usuário do serviço público é detentor de um direito de receber um serviço público adequado. Desse modo, caso o exercício do direito de greve afete o bom funcionamento dos serviços públicos, resta clara a responsabilização de quem prestou mal ou inadequadamente o serviço’. (A Greve nos Serviços Públicos - Da Proibição ao Exercício de um Direito com Responsabilidade, Estudos em Homenagem a Carlos Britto, ‘Direitos Fundamentais em Construção’, Márcia Rodrigues Bertoldi e Kátia Cristine Santos de Oliveira (organizadoras), Ed. Fórum, 2010, página 157 e seguintes). A responsabilidade administrativa ou ética deve ser apurada em processo administrativo regular, assegurando-se ao servidor o direito à ampla defesa e ao contraditório , bem como a maior margem probatória, a fim de possibilitar mais eficientemente a apuração do ilícito ou da conduta antiética. Desse modo respondemos os quesitos formulados pela consulente de forma objetiva: (a) Deve-se aguardar os primeiros 30 dias, prazo razoável e regular, previsto na Lei 8112/90, para o servidor retornar as suas atividades. Retornando às suas funções nada impede que o servidor seja intimado. (b) Caso continue de licença é preciso convocar a avaliação médica para saber se há ou não possibilidade de receber a notificação. (c) Quando o indiciado recusa-se injustificadamente a receber a intimação por sucessivas vezes, evadindo-se por exemplo, deve-se narrar tal circunstância, descrever os detalhes da recusa e fazer constar tal fato na "certidão", de como deu-se tal recusa, a exemplo do que ocorre no processo judicial com o oficial de justiça. (d) É possível fazer a intimação por hora certa de servidor que recusa-se, de forma injustificada a receber notificação de Comissão de Ética. (e) O artigo 28 da Resolução CEP e seu parágrafo único tem a seguinte redação: ‘Art. 28. Na hipótese do investigado não requerer a produção de outras provas, além dos documentos apresentados com a defesa prévia, a Comissão de Ética, salvo se entender necessária a inquirição de testemunhas, a realização de diligências ou de exame pericial, elaborará o relatório. Parágrafo único. Na hipótese de o investigado, comprovadamente notificado ou citado por edital público, não se apresentar, nem enviar procurador legalmente constituído para exercer o direito ao contraditório e à ampla defesa, a Comissão de Ética designará um defensor dativo preferencialmente escolhido entre os servidores do quadro permanente para acompanhar o processo, sendo-lhe vedada conduta contrária aos interesses do investigado’. O dispositivo tem em breve síntese o seguinte sentido. A Comissão conduz a instrução processual e coleta as provas, de ofício ou a requerimento da parte. Caso o investigado se evada, será citado ou intimado por edital. Nesta hipótese será nomeado defensor dativo, nomeado pela Comissão, preferencialmente dentre servidores de carreira para curar seus interesses. (f) A greve é um direito previsto na Constituição (art. 37, VII). É certo que o servidor não pode ser sancionado por causa da greve, mas sim pelo descumprimento de seus deveres funcionais. A greve não impede o andamento do processo ético. A consulta não diz respeito propriamente ao direito de greve, mas procura saber se o seu exercício obstaculizaria o cumprimento e o andamento do processo ou procedimento para apurar infração ética. Entendo que a resposta é negativa. O servidor pode, ser intimado em sua residência por todos os meio em direito permitidos, não havendo razão para a paralisação do andamento do processo em função da greve do servidor ou de sua categoria. O processo ético deve caminhar independentemente e inobstante o exercício do direito de greve pelo servidor”. O colegiado anuiu ao voto por unanimidade.